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12 maio 2015

História: A NOITE DO BAMBU

Pessoas com mais idade em nosso município e pesquisadores podem lembrar da histórica "Noite do Bambu", em Canguçu. Na ocasião, ocorrido no penúltimo ano do longevo governo de Borges de Medeiros, é modelar como exemplo da intolerância política e da exacerbação de ânimos vigentes em alguns municípios rio-grandenses.

Terminada a guerra civil, nem assim cessou o clima de ódios e violências, pois ao adversário da situação era defeso alcançar o poder pela via democrática do sufrágio, em face da constituição estadual e da legislação eleitoral vigentes, propiciatórias de toda a espécie de fraudes e manipulações.
Na eleição estadual de 25 de novembro de 1922, além dos conhecidos expedientes de anulação de títulos eleitorais por pessoas inabilitadas para isso, duplicidade de cédulas, transferências de mesas, chegou-se ao ridículo de o intendente municipal efetuar a apuração do pleito no quarto do hotel em que se hospedara em Porto Alegre! E tão bem se houve o solitário escrutinador, que Borges de Medeiros, derrotado por 1.145 votos contra 1.356 dados a Assis Brasil, terminou vencedor com 958 votos contra 745 de seu oponente.
No 2º distrito de Canguçu, onde Borges de Medeiros obtivera apenas 3 votos contra 344 de seu adversário, a eleição foi anulada.
Mas, se estavam praticamente livres do “perigo eleitoral”, enquanto tolerados ou estimulados tais expedientes, os donos da situação política local não davam mostras de abrandar o clima de intimidação a que submetiam seus “incorrigíveis” adversários. Isso, logicamente, nos intervalos da luta pelo poder, travada entre seus próprios membros, divididos em facções dificilmente conciliáveis.

Embora todos protestassem fidelidade e apoio incondicionais a Borges de Medeiros, a correspondência deste comprova a extensão das intrigas no seio do Partido Republicano de Canguçu, que persistiu praticamente por todo o seu longo consulado.
Clube Harmonia. Foto: Augusto Pinz/Canguçu em Foco

Os fatos e suas versões
Com vistas às eleições legislativas federais de 24 de fevereiro de 1927, caravanas de políticos da Aliança Libertadora percorriam os municípios da zona sul do Estado, em trabalho de propaganda de seus candidatos.
No dia 13 daquele mês, eram aguardados em Canguçu o deputado federal Dr. Francisco Antunes Maciel Jr., Zeferino (Ferico) Costa e Djalma Mattos.
Os aliancistas locais organizaram, então, uma recepção na espaçosa residência de Alberto da Silva Tavares, um dos melhores prédios da vila, situado na General Osório, sua principal via pública, onde hoje se localiza o Clube Harmonia. À noite, com a presença de dezenas de correligionários, entre os quais muitas senhoras e senhoritas desenvolvia-se a recepção, quando, inopinadamente, a casa foi invadida, aos gritos, por soldados do 12º Corpo Auxiliar da Brigada Militar, que passaram a espancar os participantes.
A cena de violência prosseguiu pelas ruas da vila, com a perseguição e o espancamento de todos os que tentavam fugir, pois a casa fora cercada pelos “provisórios”.
Curiosamente, esses soldados ostentavam contra civis desarmados a bravura e o ânimo belicoso que, por certo, fizera-lhes falta há apenas dois meses, quando, no dia 10 de dezembro de 1926, na Coxilha do Fogo, interior do município, foram batidos e dispersados pela vanguarda de Zeca Neto, regressando à vila, quatro dias depois, sem cavalos e sem equipamento...(Ribeiro, 1953).
É de imaginar-se o escândalo e a indignação produzidos pela insólita atitude dos“provisórios”, ainda mais que não se acreditava tivesse tamanho atrevimento partido de simples praças comandados por dois oficiais subalternos.
A imprensa governista, enquanto isso, noticiava os acontecimentos segundo a sua ótica, procurando lançar a culpa e o ridículo. Algum tempo depois, avançando em suas investigações, o Dr. Maciel Moreira pedia afastamento do cargo...
Em Canguçu, enquanto isso, era voz corrente a premeditação do atentado por parte da cúpula local do Partido Republicano. Um dia antes, 12 de fevereiro, dois desses dirigentes foram vistos no Clube Harmonia comentando a “surpresa” que aguardava os aliancistas...
No próprio dia do atentado, um soldado “provisório”, aparentado com a família Barbosa, dirigira-se a essa residência e, lacônico, perguntara pelas moças da casa, advertindo que não as deixassem sair naquela noite. As jovens, Enedina e Esmeralda Barbosa, participaram da recepção em casa de Alberto da Silva Tavares e testemunharam os fatos relatados.
Alguns soldados do 12º Corpo Auxiliar hospedavam-se no Hotel Brasil, de propriedade de Domingos Caneo Telesca e, como estivessem com o soldo em atraso, viviam praticamente sustentados pelo referido cidadão. No dia do incidente, a esposa de um dos soldados pediu à esposa do hoteleiro que não o deixasse sair para a reunião dos oposicionistas. Domingos Caneo Telesca foi uma das vítimas do espancamento.
Os indícios, pois, apontavam na mesma direção, isto é, aquele palacete que fora vendido por um terço de seu custo, segundo o alemão Eduardo Wilhelmy, e que era, agora, a sede da Intendência Municipal...
A denúncia
Um ano depois, o Diário de Notícias, de Porto Alegre, sob o título “Ecos de uma Grave Ocorrência em Canguçu”, transcrevia a denúncia do Procurador da República contra os implicados no atentado, soldadesca arraia-miúda do 12º Corpo Auxiliar.
Não sabemos como findou o processo. As buscas efetuadas no Arquivo Público do Rio Grande do Sul resultaram, até agora, infrutíferas. O certo é que a cruz do infeliz município ficou um pouco mais pesada. Em 1928, ali chegava o jesuíta alemão, Pe. Francisco Xavier Diebels, para o seu apostolado
entre tão desassistida população. Um ano após o pronunciamento do Dr. Alceu Barbedo, Alberto da Silva Tavares, em cuja residência ocorreram os fatos narrados, deixava Canguçu, mudando-se para sua fazenda na República Oriental do Uruguai(Cacimbinhas, 1929: 18).
Hoje, a sinistra Noite do Bambu é lembrada quase que só por seus habitantes mais idosos. Até as touceiras dessa gramínea, que ornamentavam a antiga Praça Marechal Floriano e que forneceram a matéria-prima para a confecção dos cacetes brandidos pelos “provisórios”,desapareceram..

Informações extraídas do artigo escrito por CORALIO BRAGANÇA PARDO CABEDA.
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